sexta-feira, junho 23, 2006

Estocolmo, meia-noite e meia. O dia do Midssomar



Midsommar.
Já mencionei a importância do midsommar, de 23 a 24 de Junho, no imaginário sueco, tão importante como o Natal.
Se nós temos o São João com as suas sardinhas e alho-porro, os suecos tem o midssommar, a festa do solstício, marcando o início do curto verão que de forma intensa se vive neste país do norte da Europa.
O Natal é a festa do inverno, do recolhimento, da escuridão dos dias com 3 horas de luminosidade, da neve e das baixas temperaturas, enquanto que o "midsommar" é o oposto, já que é a festa da luz, da alegria, da luz que teima em se manter no horizonte, dos excessos provocados pelo alcóol, da exuberância de quem vive metade do ano debaixo de condições climatéricas advessas. Como é da praxe, o consumo de bebidas alcoólicas aumenta consideravelmente, assim como o consumo de "sill" (arenque crú), "potatis" (batata nova), jordgubbar (morangos. Já o grande Ingmar Bergman se referia aos ditos, em 1957, com "Morangos Selvagens", em sueco "Smultronställe"), "fill" (uma espécie de natas) e "nubbe" (um tipo de snaps). A Suécia a partir do "midsommar" começa a laborar a meio-gás, já que é o período em que as pessoas começam as suas férias de Verão (no sul da Europa o mês das férias é, por norma, o mês de Agosto), voltando à "normalidade" (dos negócios, da bolsa, das escolas, etc) no início de Agosto. A vidas nas cidades, no caso da capital, Estocolmo, torna-se mais agradável, com menos trânsito, os parques vazios, menos stress na rua e com hordas disciplinadas de turistas. Muitos alemães, escandinávos, russos, italianos, alguns espanhóis e, em menor número, portugueses, tem a oportunidade de visitar os vários museus que tem à disposição, a maior parte gratuitos.
Neste último dia "normal", antes da grande partida, uma notícia captou-me a atenção nos media suecos (para além do inevitável mundial de futebol em vésperas de um Suécia-Alemanha), e que fazem pensar sobre este país de cariz "social-democrata", ultimamente alvo de interesse por parte da intilegentia portuguesa. Refiro-me, concretamente, à pequena notícia (já vão perceber porquê) sobre a venda por parte da SAAB (que não fabrica somente carros, estes já pertencem à GM norte-americana) ao Paquistão de sistemas de defesa/radar electrónicos aéreos do tipo Erieye (da sueca Ericsson Microwave Systems, do grupo Ericsson), montados em aviões SAAB 2000. Trata-se de uma encomenda de 8,3 biliões de coroas suecas, cerca de 810 milhões de Euros, e vem juntar-se a uma anterior encomenda por parte da força aérea sul-africana do jacto interceptor "Grippen". É assim, que este povo amante da floresta, dos lagos, da natureza, "neutral" até à ponta dos cabelos (os noruegueses que o digam, quando a Suécia deixou a Wermacht nazi atravessar a Suécia para atacar a Noruega), dos carros amigos do ambiente (os biopower da Saab), e da segurança (a Volvo), da IKEA e do design democrático, da ajuda aos países do terceiro-mundo (são, por exemplo, os maiores contribuintes de ajuda humanitária a Moçambique), da defesa do meio-ambiente, são, ao mesmo tempo, o nono maior exportador mundial de armamento, com importância idêntica em termos de exportção a tipo de produtos que nós associamos à Suécia, como os automóveis e o mobiliário. As contradições suecas não me deixam de surpreender. Daí, penso eu, o pouco realce dado à noticía, já que armamento não rima com Suécia. Estou-me a esquecer de um dos "pais" deste tipo de indústria, Alfred Nobel, do famoso prémio Nobel, era sueco e não foi ele o inventor da dinamite. Enfim.
A encomenda do Paquistão trouxe aos suecos uma amarga recordação de perto de trinta anos, o perfume agri-doce de um escândalo perconizado pelo primeiro-ministro de então, Olof Palme, que os suecos ainda hoje tem dificuldade em perceber, tal a importância que o mito Palme ainda tem na vida pública sueca (essencialmente nas hostes do partido do governo, o partido social-democrata). Palme, na altura no apogeu da sua carreira política, a cara dos países não alinhados (a tal neutralidade sueca) conseguiu vender, qual feirante, sistemas de mísseis sofisticadíssimos Carl-Gustaf, da Saab Bofors Dynamics, tanto ao Paquistão como à Índia, que, por essa altura, encontravam-se em guerra. Na altura falou-se em "luvas" e outras histórias pouco dignificantes para um povo que se acha acima desse tipo de situações, tendo mesmo manchado a parte final do mandato de Olof Palme, assassinado em 1986, numa rua central de Estocolmo (umas das teorias sobre o assassinato de Palme passa pelos mísseis vendidos durante o conflito indo-paquistanês).
Bem, chega de armamento, que hoje, dia de Midssomar, a Suécia vai precisar mais da deusa Fortuna do que qualquer tipo de armamento para levar de vencida a selecção alemã. Mas, como a bola é redonda, nunca se sabe, talvez no meio da "landslag" sueca exista algum Nobel pronto a dinamitar a defesa alemã. E que algum do dinamite chegue para nós, que bem necessitamos para o embate de Domingo com os holandeses amargos.

1 comentário:

CELTA MORGANA disse...

Arranja uns Santos para essa malta ter algo mais (i)material para festejar. Comemorar a geografia e fenómenos celestes, não dá com nada . . .
Evangeliza...Evangeliza...