terça-feira, janeiro 03, 2006

Auto-estradas urbanas?

Há uns tempos atrás, numa auto-estrada brasileira, pouco depois de pagar a portagem, de ver um belíssimo exemplar equídeo a pastar na faixa separadora, e de deixar passar um grupo de crianças na passadeira (!), deparei com um placard de grandes dimensões que transmitia aos passantes a seguinte mensagem: "Se pretender construir casa na berma da auto-estrada, telefone primeiro para zero-zero-meia-meia-sete-meia". Apesar do abalo sofrido pela minha formação em Planeamento, em vez de chorar, fartei-me de rir... e andamos nós, portugueses, sempre a lamentar o nosso (des)ordenamento do território!
Deste lado de cá do Atlântico, de facto, as coisas passam-se totalmente ao contrário. A regra é: primeiro constroem-se as casas e só depois surgem as auto-estradas, designadas então por auto-estradas urbanas.
Expliquemo-nos melhor e, para o efeito, socorramo-nos de um exemplo de Águeda: a Avenida Calouste Gulbenkian (via que liga o cemitério de S. Pedro à GNR). Construiram-se os edifícios, quer de habitação quer de serviços, e, pouco mais tarde, foi aberta a tal avenida, que rapidamente se transformaria numa movimentada artéria urbana, com relevância para a organização do tráfego citadino.
A sua importância aumentou recentemente com a significativa expansão da função habitacional na zona. A nossa Câmara Municipal reconhece-lhe essa importância e trata-a bem. Bons passeios, boa iluminação, estacionamento bem dimensionado, passadeiras para peões numerosas, bem situadas e bem sinalizadas. Até tem um placard, este virtual, cuja mensagem é lida por um grande número de utilizadores da via da seguinte forma: "Se pretender conduzir a velocidades próprias de uma auto-estrada a poucos metros de casas de habitação, não telefone... vá!".
Uma via urbana bem tratada rapidamente se transforma numa auto-estrada urbana, não pelo seu perfil, mas pelo comportamento irresponsável (tenho uma grande lista de adjectivos para aplicar aqui) de muitos (muitos mesmo) condutores, que, ao circularem a velocidades que não se coadunam com qualquer urbanidade (e civismo, já agora), põem em perigo os outros utilizadores da via. Atravessar a avenida numa passadeira é uma aventura perigosa! Tirar o carro de um dos lugares de estacionamento existentes ao longo da via é um desporto radical! Entrar na avenida por um dos cruzamentos existentes pode fazer lembrar a recruta dos Marines!
Que soluções? Mudar mentalidades e comportamentos...? Era bom, mas é muito difícil. Reler Darwin para evoluir e adaptar à situação e... que sobreviva o mais forte (o mais motorizado)? Não me parece. Nada a fazer, desistindo do direito à nossa qualidade de vida? Esta é possível, mas não desejável. Até porque há soluções... e não são poucas, nomeadamente a nível do desenho. Mais, algumas dessas soluções até são baratas (um atributo essencial nos tempos que correm). Perguntem aos planeadores que trabalham na Câmara Municipal. Eles sabem... até têm referências bibliográficas!

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