terça-feira, fevereiro 20, 2007

12 quilómetros dinamarqueses e um amigo de Portugal.


Pois, a preparação para a Maratona de Estocolmo no próximo mês de Junho está ligeiramente emperrada. Desde o inicío do ano que não tenho treinado como devia mas, com as temperaturas baixas que se fazem sentir nesta época do ano em Estocolmo, hoje, por exemplo, estão -10, não permitem grandes correrias. Ainda por cima com o piso gelado, as quedas espreitam. Os únicos quilómetros que fiz este ano foram em Copenhaga, onde estive recentemente. Aí, quase parecia que estava em Portugal, salvo seja, sem neve e com temperaturas positivas. A minha visita à pátria da já famosa para nós portugueses flexisegurança, que não tem sido lá muito bem explicada à populaça, tratando-se mais de um grande "show off" por parte dos nossos actuais governantes, tal a diferença das realidades sócio-económicas entre os dois países, foi feita a convite de um amigo meu, CEO de uma multinacional das telecomunicações a operar naquele país. Esse meu amigo, que já passou por Portugal em funções idênticas e, que escolheu o nosso país em detrimento de outros países, influenciado que foi por mim quando questionou Portugal como destino do convite que lhe tinham então feito, é um dos maiores embaixadores que conheço de Portugal por estas paragens do Norte. Nos quatro anos que esteve no nosso país, aprendeu quanto basta a língua de Ruy Belo, ficou a gostar de bacalhau, da forma de estar e profissionalismo dos portugueses nas TIE, do piri-piri e, pasme-se, do café Delta. Depois dos quatro anos passados na doçura portuguesa, regressou a Estocolmo, facto que a mulher não achou grande piada, habituada que estava à realidade nacional, à abertura das pessoas e ao calor dado às crianças. Conheço estes meus amigos desde os meus tempos dinamarqueses, na Universidade de Aarhus nos anos 90, a minha segunda pátria, e o destino fez que nos encontrássemos agora em Estocolmo. De facto, ficámos quase vizinhos, e nestes 3 anos passados aqui, em Estocolmo, este meu amigo muitas saudades carpia do nosso país, outro dos tiques que tinha ganho, a saudade, e quando não corríamos pelos bosques, também têm a "pancada" do jogging, muitas horas passámos a discutir um país que para ele também se tinha tornado familiar e próximo, Portugal. Dizia-me ele, que a coisa que mais lhe irritava nos portugueses era o fatalismo e o imobilismo face aos problemas, ou seja, a resignação e a falta de ambição quanto ao futuro, o que, para um escandinávo, é muito mal visto. Enquanto, digamos, num determinado problema um escandinávo antevê logo a hipótese de arranjar soluções, e daí fazer negócio, o português, dizia ele, fica bloqueado e resignado. Contava-me, ainda, que várias vezes tinha tentado cativar os melhores elementos da sua equipa portuguesa, que no conjunto desta multinacional (estou a falar da maior de todas neste sector), eram dos melhores, a irem para fora, a tentarem outras posições nesse grupo internacional, já que capacidade não lhes faltava. No entanto, tarefa impossível essa, já que esses bons técnicos queriam antes ficar em Portugal, na segurança, em vez de tentarem novos "inputs" e desafios. Dizia-me ele, enquanto bebíamos um café, obviamente Delta, que lhe é enviado de Portugal por pessoas amigas, entre elas eu, na sua casa em Copenhaga com a Suécia no outro lado do estreito de Öresund, que não percebia como é que era possível nestes tempos da "globalização" que também passa pelas carreiras, os portugueses serem tão apegados ao seu território, quase que renegando o passado, quando partiam por esse mundo fora em barcaças e com muito engenho, dando novos "mundos" ao Mundo. No regresso a Estocolmo, no comboio sueco X2000, ecológico e amigo do ambiente lê-se no seu dorço (http://www.sj.se/sj/jsp/polopoly.jsp?d=260&a=342&l=en&l=en), idêntico aos nossos pendulares, e que faz a ligação entre as duas capitais escandinávas em 5 horas (os suecos e dinamarqueses, economias débeis... não querem ouvir falar em TGVs e alta velocidade, já que consideram um luxo muito caro, os pendulares que andam mesmo a 200 Km, chegam e sobram para as necessidades), enquanto atravessava a ponte Öresundsbron (http://osb.oeresundsbron.dk/frontpage/?lang=1) entre Copenhaga e Malmö, lembrei-me destas conversas sobre Portugal com este meu amigo e recordei-me de um estudo efectuado por Maria Filomena Mónica, socióloga brilhante, onde, entre outros tópicos analisados, o que me vêm à memória, reside sobre a (falta) de mobilidade dos portugueses. Maria Filomena Mónica, (injustamente) mais conhecida pelo seu "Autobiografia Bilhete de Identidade", e autora de uma fabulosa biografia de Eça de Queirós, do que pelo seu papel na Sociologia no nosso país, efectou um estudo sobre os comportamentos da sociedade portuguesa, antes e pós 25 de Abril, chegando à conclusão que os portugueses, por norma, não são dados à mudança, ficando-se geralmente pelo seu pequeno perímetro regional. Logo, os sonhos são regionais. E lá fora, a paisagem monótoma e verde da Småland sueca, quilómetros atrás de quilómetros de árvores e mais árvores, berço de uma empresa que nasceu regional e transformou-se na multinacional referência do seu sector, a IKEA, vai passando qual TV plasma. Será o nosso fado?
Obs. Texto escrito enquanto ouvia a emissão online da fabulosa "Rádio Radar Lisboa" (http://www.radarlisboa.fm/main.php?id=1).

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